Patamar de um dos blocos de salas de aulas no liceu. 16 anos. Concerto da banda de alguns alunos, de que todos eramos fãs, obviamente. Um elemento estranho está lá para documentar o evento, atrás de uma câmara de vídeo. E é este o momento em que o amor começa a lixar-me a vida.
Apaixonei-me de uma hora para a outra por uma pessoa que nem sabia que eu existia. E que me ignorou todo o tempo que pôde, apesar de eu fazer questão de lhe entrar pela vida dentro sem pedir licença. Num estilo "stalker-ish" até. E andei nisto durante seis anos, numa obsessão paralisante. Seis anos, true story. Há coisas que eu fiz por esta pessoa que me fazem ter pena de miúda que eu fui. Teria tanto para lhe dizer hoje! Acreditava piamente que ele era o amor da minha vida, que um dia ele ia perceber isso, que o ia salvar dos fantasmas dele... ah, sim, sou essa miúda que acha que vai mudar o mundo de alguém e que cai redonda por almas atormentadas! Pintei-o como um deus e o que consegui foi que duas das minhas melhores amigas se apaixonassem por ele também! Duas, em alturas diferentes da vida. Sofri como nunca mais e destruí a fantasia de amor da vida. Rebentei-me em lágrimas, fechei a miúda num sótão, jurei nunca mais correr atrás de ninguém e fingi ser adulta a partir daí.
Os homens que me aconteceram entretanto nunca tiveram hipótese de compensar isto. Amei-os de verdade, sim, mas vivi a dar sem esperar receber, e no fundo usei alguma da estabilidade emocional que daí tirava para me organizar, para cumprir objetivos de vida. Transplantei partes do meu coração para três novas vidas, únicos amores incondicionais possíveis, mas falta-me alguma coisa. E é minha responsabilidade nunca ter exigido, procurado, achado que merecia. Não corro atrás, e essa cicatriz prendeu-me ao chão.
Na verdade, nunca consegui deixar de ser aquela miúda de 16 anos. Do sótão ela conseguiu sempre espreitar as estrelas e sabia que eu a ia buscar um dia. Sou 90% coração, não há cura. Sou alma que precisa de sentir intensamente com uma frequência diária. Que se alimenta de arrepios, de música alta, de soluçar, de amor, do prazer e da dor... tudo em doses catastróficas. É aceitar isto.